
Outro dia eu estava assistindo
uma aula “teen” de Aikido no
Aizen, fiquei muito contente em ver o empenho da garotada. A turma aplicava as
técnicas com atenção, caia, levantava, interagia com os alunos mais experientes,
buscando aprender essa difícil arte. Naquele momento, busquei na memória como
me sentia quando iniciei a prática do Aikido, confesso que eu não era um
adolescente...rsrs, mas tinha interesse em aprender com a mesma energia. Inclusive,
também tinha uma curiosidade, como a maioria dos praticantes, sobre a aplicação
do Aikido como defesa pessoal. Eu ficava me perguntando... “onde está a defesa
pessoal no Aikido? Como se dá na prática?”.
Bem, mesmo praticando Aikido há
alguns anos e buscando informações dessa arte em livros, trocando idéia com os
amigos, sites, artigos, eu sentia certa dificuldade em responder essa pergunta.
Conversando com meu Sensei Santos (5º dan) em uma das nossas caminhadas
matinais no Parque da Cidade, perguntei a ele se em algum momento o seu Aikido
teve que ser acionado como defesa pessoal. Ele parou, pensou um pouco e me
disse que uma vez, num pequeno acidente de trânsito envolvendo um taxista de
cabeça quente, naquele momento ele teve que aplicar uma técnica para evitar uma
agressão e controlar a situação.
Depois de ouvir a história fiquei
fazendo contas, para visualizar uma estatística: número de ocorrências de
defesa pessoal versus anos de prática de Aikido do meu mestre. Puxa, mas nesse
mundo cada vez mais violento, o Aikido não seria uma arte de defesa pessoal que
deveria ser utilizada com mais frequência? Cheguei a uma conclusão
aparentemente incoerente, um evento em 38 anos! Algumas pessoas podem até
pensar que as técnicas de Aikido deveriam ser utilizadas mais vezes, particularmente
os mais jovens, vendo aqueles vídeos incríveis no “youtube”, com imagens
fantásticas de pessoas “simples” se livrando de brutamontes armados e mal
encarados.
Mas afinal, será que o Aikido foi
criado para o fim de defesa pessoal? Vendo a estatística do meu mestre, isso
não é paradoxal? Será que vale a pena treinar tantos anos para aplicar uma
técnica de defesa somente uma vez na vida?
O que vou dizer a seguir, acho
que pode ajudar aos mais jovens e iniciantes no tema. O Aikido foi criado para
dotar o praticante de postura que permite aplicar técnicas apropriadas em
qualquer situação que você precise se defender! Vou explicar, o Aikido traz um conceito
básico encontrado nas artes marciais: a autodefesa. É uma defesa pessoal em que
você aprende a se portar para preservar sua integridade física e mental. Como
assim? O Aikido é mais do que
aplicação de torções, projeções ou imobilizações, ele capacita o praticante a
buscar se defender dos ataques mais freqüentes na vida e que, se não forem
tratados adequadamente, muitas vezes deixam as pessoas em maus lençóis.
É assim, quando temos uma
tendência natural da nossa personalidade, por exemplo, de reagir a uma provocação
com ímpeto de agredir o provocador, deixamos que o impulso domine nossas
atitudes, como resultado pode-se gerar uma situação que fuja do controle: uma
briga. Nesse caso, o Aikido pode nos ajudar a nos defender, não no momento do
contato físico, mas antes, na atitude de controlar os impulsos negativos, por
meio do treinamento das técnicas na posição daquele que recebe (nague). Por
exemplo, numa situação em que o colega de treino na posição de aplicar a
técnica (tori) exagera na dose, certamente geraria em nós um sentimento ruim,
no mínimo uma dor física... rs, no entanto para contornar o momento, o clima
nos treinos induz os praticantes a buscar uma forma racional para agir, levando
os praticantes a no mínimo conversar para que o tori diminua a carga, e assim
de forma quase imperceptível nós vamos transformando maus hábitos para uma
postura mais equilibrada, que acaba por refletir também no ambiente fora do
Dojo.
Segundo alguns psicólogos não
devemos reprimir as emoções, “engolir o choro” como dizia a minha mãe, mas sim
“conversar” com elas, para que se chegue a uma postura adequada: fazendo o nosso
lado racional agir, questionando a atitude impulsiva e analisando a situação
sob o aspecto das conseqüências, segue alguns exemplos de perguntas possíveis: será
que a reação com violência nesse momento, vai resolver a situação? Será que eu
tenho parcela de responsabilidade na reação do provocador? Quais são as
conseqüências se eu for para as vias de fato?
Lembro de o meu mestre comentar
sobre outras várias situações em que ele parou e pensou duas vezes antes de
agir, e desse modo ele pode chegar a uma solução mais racional e adequada. Eu
me recordo também do sensei Santos nos aconselhar para estejamos atentos a todo
momento, sobre as situações que podem colocar em risco nossa saúde física e
mental, afinal “o mal não dorme!”.
Outro mestre do Planalto Central
comentou sobre essa forma de autodefesa, foi o sensei Martins[1] : “No Aikidô, não tem poder. Tem equilíbrio,
encontro do homem consigo mesmo”, ensina o mestre. E justifica o que diz: “Um
dia, um aluno chegou pra mim e disse: ‘Mestre, antes de fazer Aikidô, eu saía
na noite e se alguém olhasse pra mim com cara feia, eu já partia para a
agressão. Eu era o forte. Agora, não tem nada disso. Aprendi até a dominar meus
impulsos’. Aikidô é isso: é vibração, não é apenas uma defesa corporal. É uma
defesa de vida. E digo mais: é a arte do equilíbrio do terceiro milênio”.
Nas nossas vidas temos que
enfrentar desafios a todo momento, em que a atitude de defender a nós mesmos,
nossos valores, nossas idéias, com inteligência e equilíbrio seja necessária
para que possamos continuar centrados no que é melhor, essa é a defesa pessoal
mais efetiva. A construção de uma atitude de autodefesa é um trabalho de
mudança de consciência dentro de nós mesmos, que demanda tempo e prática do
Aikido.
Para finalizar, gostaria trazer um
comentário do filósofo grego Plutarco sobre a necessidade de se construir uma
atitude de autodefesa para a vida. Conta a história que quando Plutarco
perguntou aos espartanos, por que a cidade de Esparta não tinha muros para
protegê-los, eles responderam: “Nós somos os muros de Esparta”.
Obrigado pela atenção e
paciência.
Forte abraço!
[1]
Trecho de uma entrevista dada ao Correio
Braziliense por ocasião do reconhecimento do grau de 6º Dan.
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Gde Werley!!! Ótimo texto... ótimas reflexões!
ResponderExcluirCitando mais uma vez o Prof Lapa: "o Aikido é arte nobre demais pra se restringir à uma técnica bem executada."
Ele vivia falando isso pros seus alunos. Acho q ele tem razão!
Obrigado por retomar isso em nós!
Parabéns Mano, excelente texto, não só para informações sobre Akido, como para boas reflexões para o nosso dia a dia.
ResponderExcluirMuito legal, Werley!
ResponderExcluirAdorei o artigo!
Recordo-me do meu mestre (durante 7 anos pratiquei Kung-Fu), que sempre dizia:
"Aquele que vence o outro pode ser considerado forte, mas aquele que vence a si mesmo, este sim é poderoso."
Ou ainda:
"Forte é o homem que vence sem lutar, mesmo tendo a força para vencer lutando. "
Abraços,
Gustavo
Werley, parabéns!
ResponderExcluirExcelente artigo.
Ainda sou iniciante na arte do aikido e da mesma forma que você disse no início do artigo, também a procurei como forma de defesa pessoal. Cada dia me conscientizo de que estava completamente errado, pois a autodefesa nunca foi o objetivo da arte e sim consequencia da sua prática.
Hoje, percebo mudanças em minhas atitudes, percebo um novo posicionamento em situações que antes levariam a conflitos (discussões, agressões, desavenças).
Sou muito grato a todos os mestres que a divulgam pelo mundo, pois assim ajudaremos a construir uma sociedade melhor ou, nas palavras do meu mestre (Gustavo Sensei):
"não mudamos o mundo mudando as pessoas e sim a nós mesmos pois, através do nosso exemplo, a vida, as coisas e tudo ao nosso lado muda também..."
Um grande abraço a todos.
Mauro Cantuária
Excelente explanação.
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