quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

AIKIDO – Política e Harmonia

PorTiago Vieira de Oliveira Borges
Shodan do ITN- Instituto Teruo Nakatani - Goiânia

Nestes aproximados 11 anos de prática desta bela e difícil arte marcial, me chamou a atenção um aspecto que sempre é tratado à “boca pequena”, em cochichos pelos corredores e em trocas de e-mails “secretos”, qual seja: a política.

Antes de entrar nos pormenores, peço licença para fazer um breve apanhado conceitual deste já famigerado termo. Numa breve incursão no Wikipedia temos que: “O termo política é derivado do grego antigo πολιτεία (politeía), que indicava todos os procedimentos relativos à pólis, ou cidade-Estado. Por extensão, poderia significar tanto cidade-Estado quanto sociedade, comunidade, coletividade e outras definições referentes à vida urbana”. Além disso não poderíamos deixar de citar a célebre frase de Aristóteles: “ O Homem é um animal político”.

 Deixando de lado o conceito pejorativo da política, e observando-a por um prisma diferenciado, temos que a política é a arte de convivência entre as pessoas em determinado ambiente, tentando conjungar diversos aspectos morais, psicológicos e de modo de vida. Poderia também ser dito que inclui um indíviduo ou coletividade tentando fazer valer suas vontades em detrimento de outrem sem, no entanto, gerar um conflito que extravasasse o campo das ideias.


Não quero me tornar enfadonho e entrar em discussões acadêmicas sobre termos e conceito e fazer com que você – leitor - me abandone antes que eu possa concluir meu artigo. Então, antes de entrarmos na ideia a que o título remete, deixo apenas um breve significado da palavra Harmonia: “conceito clássico que remete às ideias de beleza, proporção e ordem”.
Isto posto, seria a prática da política algo condizente com a harmonia? Qual foi a intenção de Morihei Ueshiba ao propor a nós - homens e, portanto, animais políticos - uma arte marcial que requer harmonia por parte dos praticantes?

Em meados da década de 40 do século passado começou a ser delineado esta ideia de que uma arte marcial poderia ser utilizada como fonte de uma convivência mais harmonica entre os homens, já que todos estavam aterrorizados com o ponto em que chegamos através da confecção de artefatos bélicos que poderiam facilmente dizimar, em segundo, milhares de pessoas, não fazendo distinção entre soldados inimigos e sociedade civil.

Dentro deste contexto, os homens deveriam voltarem a si mesmos, tentando se aperfeiçoar (psicologica e fisicamente) e as armas serviriam não mais para matar e, sim para nos auxiliar na evolução do nosso auto-controle, tudo iso com o intuito de podermos conviver de forma harmonica e pacífica perante nossos semelhantes, criando, assim, uma sociedade melhor.

Desta forma, o desenvolvimento da arte se deu sem maiores percalços enquanto viveu o Fundador. Nesta fase, os treinos ocorreram principalmente no Japão com clara intenção de se espalhar pelo planeta, já que para atingir o fim proposto, todos os homens (leia-se: homens, mulheres, crianças, idosos, etc, não me tenham por machista) deveriam ter acesso à pratica da arte.

Com o falecimento de O-Sensei, intensificou-se a diáspora do Aikido pelo mundo e, tenho para mim, começaram os problemas  de ordem política. Como não havia mais uma pessoa que personificasse os ideiais da arte, logo surgiram problemas de hierarquia, envolvendo tudo aquilo que nos torna humano, inveja, ciúmes, vaidade e por aí vai. Logo, a implosão da harmonia proposta pela arte deu-se em sua fonte, onde surgiram organizações dissidentes daquela oficialmente criada.

E, juntamente com divulgação do Aikido pelo planeta, de seus nobres ensinamentos e movimentos fluídos e plásticos, importamos também todos os problemas organizacionais. Em terras tupiniquins defederam a tese que os problemas advinham dos arcaímos dos professores japoneses que aqui desembarcaram e que a solução estaria em solucionarmos a moda ocidental, já que tudo não passava de conflitos culturais.

Assim, criamos uma, duas, dezenas de organizações que, não só não resolveram as diferenças, como conseguiram o grande feito de ampliá-las, a despeito de não promovermos campeonatos entre os praticantes e, assim, supostamente não alimentarmos rixas de caráter egocêntricos. Então, hoje, enquanto escrevo aqui do cerrado brasileiro, posso dizer que somos um exército de praticantes de Aikido, assim como queria o Fundador, mas sem, ou com pouca, comunicação e pratica entre si, algo que ele não deve ter imaginado.

Dado este sucinto relato, as vezes me pergunto qual a finalidade de minha prática no Aikido, se, no fim, isto acabará me levando à desentendimentos com aqueles que já foram meus companheiros de treino e, desta forma, me abster do convívio deles ao invés de estar agregando mais e mais  braços à nossa causa?

Durantes muitos anos vivi numa ilusão, que era a da convivência entre pessoas de diversas culturas, credos, idades que se mantinham de forma harmoniosa e tolerante por terem como ponto em comum o estudo e a prática do Aikido ( me lembrei agora da musica Imagine do John Lennon). Mas esta ilusão foi duramente solapada pela realidade do ser humano, onde a  prepotência, a vaidade e o orgulho tolo não dão espaço para nenhum tipo de harmonia.

Se continuo os meus treinos? Sim, claro! Ainda não fui “infectado” por esta “doença” que acomete a tantos, tenho o maior prazer de treinar com todos os praticantes e também em ensinar o pouco o que sei da arte, de certa forma ainda sigo em minha ilusão e tenho muito a percorrer nesta difícil trilha. Gostaria apenas de deixar aqui uma pergunta  para você que teve paciência de me acompanhar até aqui:
  
“Você, que está no túnel a mais tempo do que eu, existe luz no final?”

Um comentário:

  1. Este é um tema que pede uma maior reflexão, até um debate.Pois é recorrente e afeta muitos praticantes

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