segunda-feira, 16 de maio de 2011

O Selo Kisshomaru Ueshiba sobre o Aikido Moderno


Por: Stanley Pranin
Tradução: Carlos Manosso Junior (Aizen Dojo – Brasília/DF)
Fonte: Aikido Journal - 
http://migre.me/4yCCC

Eu gostaria de dedicar alguns parágrafos na grande influência do segundo Doshu Kisshomaru Ueshiba (1921-1999) sobre o aikido tal como o conhecemos atualmente. 

Fui motivado a escrever neste momento porque tenho notado um enorme desconhecimento sobre as muitas contribuições de Kisshomaru, em razão do foco dado sobre os pontos de vista e ações do Doshu atual, Moriteru Ueshiba Sensei, a frente da organização Aikikai. Este sentimento de mudança é completamente compreendido como um fenômeno histórico e dado o tempo passado desde a morte de Kisshomaru, há 12 anos. 

Por que Kisshomaru é discutivelmente[1] a figura mais importante da história do aikido, além de seu famoso pai Morihei Ueshiba, o fundador? Deixe-me discorrer poucas palavras dos seus pensamentos sobre o aikido moderno dentro do contexto do sistema Aikikai, a entidade politicamente dominante da arte. 



Quando conheci Kisshomaru Sensei, em 1963, ao sul da Califórnia durante sua primeira visita internacional, ele aparentou ser um pouco tímido, um homem humilde e gentil, contendo um conhecimento e uma habilidade incrível na arte. Sua maneira de ensinar com voz serena pareciam próprias para fazer-nos aprender o básico da arte como o Aikikai Hombu Dojo ensinava durante aquele breve período de tempo. 

Kisshomaru foi muito ofuscado pelo carismático Koichi Tohei, seu cunhado, que já ministrava vários seminários no exterior, especialmente no Hawaii, e estava iniciando um pequeno envolvimento dentro dos Estados Unidos. Kisshomaru, ao contrário, era visto como o filho do fundador e responsável pelo Aikikai Hombu Dojo, estando mais envolvido nas tarefas administrativas. Seu papel como instrutor da Aikikai era visto como uma posição dada a ele como sendo o filho de Morihei, mas ele foi, sem sombras de dúvida, o melhor exemplo de técnica ou professor de habilidade extraordinária no grupo de instrutores junto com Tohei. 

Quando Koichi Tohei foi resignado da Aikikai, em maio de 1974, sua ausência deixou um enorme espaço que deveria ser rapidamente preenchido pela Aikikai para preservar sua proeminência como principal organização política no mundo. Foi neste momento que Kisshomaru decidiu assumir a liderança sobre todos os assuntos relacionados ao aikido, e começou a reformular a Aikikai de acordo com seu ponto de vista, enquanto saia de cena aquele manto pesado de Koichi Tohei. 

O novo ativismo de Kisshomaru tomou várias formas. Ele trabalhou sistematicamente para padronizar o currículo do aikido, e seu esforço pode ser visto na nova geração de instrutores, jovens com 20 e 30 anos, cujas técnicas começaram a ficar bem parecidas com a de Kisshomaru. Esta percepção é bastante notada no processo de treinamento do seu segundo filho, Moriteru, o seu sucessor como Doshu. As técnicas de Moriteru tornaram-se quase idênticas as do seu pai, e sua forma pedagógica de ensinar muito semelhante. Além de servir como modelo para formação dos jovens instrutores da Aikikai, a educação de Moriteru garantiu a propagação do legado das técnicas e formas de ensino de Kisshomaru para o futuro. 

No segundo semestre dos anos 70 e 80 também vimos a publicação de vários livros técnicos de autoria de Kisshomaru que mostrou ao mundo um currículo formal que serviria de forma básica para o ensino do aikido dentro da rede Aikikai. Seu filho Moriteru também começou a aparecer nos livros, inicialmente como “coadjuvante”, e mais tarde como “ator principal”. Esses livros tornaram-se um canal muito forte para popularização de uma forma padrão de ensino entre os instrutores e federações dentro do sistema Aikikai. 

Seguindo o seu propósito, Kisshomaru trabalhou na criação de uma versão oficial sobre a história do aikido, começando com a biografia sobre seu pai, entitulada “ Morihei Ueshiba, o Fundador do Aikido”, em 1977. Com o intuito de prover uma boa quantidade de materiais até então não publicados sobre a vida de seu pai e os primórdios do aikido, o trabalho de Kisshomaru deixou claro o posicionamento da Aikikai através de um número de publicações históricas, tais como:

  • A influência de Sokaku Takeda e o Daito-ryu Aikijujutsu na formação do aikido;
  •  A versão centrista de Morihei Ueshiba sobre seu envolvimento com a religião Omoto;
  • Uma minimização da extensa conexão, nos primórdios do aikido, para com os políticos da direita e instituições e pessoas militares;
  • Os papéis obscuros que tiveram o sobrinho de Morihei, Yoichiro Inoue, Kenji Tomiki, e Koichi Tohei dentro da evolução da arte.


Kisshomaru apropriou com grande habilidade a imagem do fundador disseminada pela Aikikai a serviço dos objetivos e visões da organização para a grande comunidade do aikido. A imagem de Morihei serviu como prova da legitimidade inquestionável da autoridade da Aikikai, enquanto mantinha aquela impressão não muito clara que impedia análises mais detalhadas ou interpretações alternativas. Pouco a pouco, uma forma mais “politicamente correta” tomou conta do sistema Aikikai, o que desencorajou estudos e publicações históricas independentes que acabavam destoantes do escopo dos limites aceitáveis do contexto da vida e da arte de Morihei Ueshiba. 

Desde o final dos anos 70 até 1998, eu entrevistei Kisshomaru Sensei para publicação de artigos por cerca de 12 vezes. Eu estava apto para testemunhar em primeira mão a evolução do pensamento do Doshu sobre vários assuntos históricos, e identificar áreas sensíveis que, por razões pessoais ou organizacionais, ele preferia evitar ou desconversar. 

O comportamento suave de Kisshomaru escondia seu pensamento politicamente sensato que ele usou em sua boa posição para atingir os objetivos organizacionais da Aikikai. 

Durante a última década de sua vida, Kisshomaru criou condições onde os políticos rebeldes que ficaram ao lado de Koichi Tohei na separação da Aikikai, pudessem retornar às graças da organização mãe. Sua atitude de perdão acima daquela “ferida profunda” que levou tempo para cicatrizar sem dúvidas aumentaria seu crédito nas análises e escritos sobre o futuro aikido. Kisshomaru também teve um senso crítico para aceitar inúmeras federações independentes e sem renome para dentro da Aikikai, nas ocasiões onde o tamanho e afinidade atingiam os critérios necessários.

Por volta de 1990, o status de Kisshomaru como figura predominante no mundo do aikido, tornou-se consolidada dentro da esfera de influência da Aikikai. O modesto, filho sardento de Morihei Ueshiba transformou-se numa grande força pelos seus próprios méritos, e começou a receber um tratamento acolhedor aonde quer que ele fosse. 

Agora um elegante, avô adorável, ele exerceu uma autoridade inquestionável sobre todas as coisas relacionadas ao gerenciamento da arte dentro do domínio da Aikikai. O “selo” Kisshomaru tornou-se firmemente impresso sobre o aikido, e seu futuro garantiu a influência necessária por pelo menos duas próximas gerações através de seu filho Moriteru e do seu neto Mitsuteru.


[1] Apesar da indiscutível contribuição do segundo Doshu, Kishomaru Ueshiba, para o desenvolvimento no Aikido e sua disseminação pelo mundo, o texto original do autor utiliza o termo "arguably" e não “unarguably” ao descrever essa relação, tal como: "Why is Kisshomaru arguably the most important figure in aikido history, apart from his famous father Morihei Ueshiba, the arts founder?...”


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